A Festa do Mastro em Capela
"EU AGRADEÇO ¯"Este ano tá mais animado
que os outros." "Olhe a sarandaia, olha a sarandaia
Estas são algumas observações dos moradores da cidade de Capela. durante a realização da sarandaiai (O termo Sarandaia ou Sarandagem, segundo os dicionários, signifca vadiagem, vagabundagem, andar em pagodes, brincar, divertir-se), festa que abre as comemorações do ciclo junino. Ela tem início às 22 horas do dia 31 de maio. A sua realização é muito simples: sai um grupo de pessoas ao som de um terno de Zabumba, com um balaio (cesto), seguido por aláuns bacamarteiros, pelas ruas da cidade cantando: Oi "seu" (fulano) Traga a cachaça (Recolhido na Sarandaia de Capela no ano de 1994, pela Prol~ Aglaé D'Ávila Fontes de Alencar). Inicialmente o cortejo é acompanhado por poucas pessoas e vai aumentando durante o seu percurso. As casas estão fechadas, as luzes apagadas, porém ao ouvir "a pedição" acende-se a lâmpada, abre-se a porta e recebe-se os músicos com bebida (cachaça). Em seguida o dono da casa oferece um presente para ser colocado no mastro, no dia de São Pedro. Os músicos agradecem e seguem em direção a outra residência. O cortejo segue noite adentro pelas ruas previamente selecionadas. Os moradores vão se envolvendo, cantando, dançando e os bacamarteiros dando seus tiros. "A festa é boa, é a melhor de Capeia. A festa tem mudado pra melhor. O povo tá participando mais e é a primeira festa do mês de São João". (José Altamir, zabumbeiro, há 25 anos acompanha as saídas da sarandaia, da baiana e o Mastro). Segundo "Seu" Manuca (Manoel Oliveira Andrade), um dos organizadores da festa, tudo começou em 1939. "Iniciamos a festa por intermédio
de uma família tradicional aqui de Capela, a família Melo: Nelson Francisco
de Melo, Napoleão Francisco de Melo, Wilson Melo e Anderson Francisco
de Melo. Eu, rapazinho novo, tocava trompete na Orquestra e até na casa
deles mesmo em farra. O Napoleão tinha uma bodega, então ele se entendeu
com os irmãos de fazer um Mastro de São Pedro, e a partir daí nós sempre
comemoramos, até hoje, a rapaziada nova e eles mais velhos. Até hoje eles
vivem. Criaram o Mastro de São Pedro. Mas acontece que esse Mastro devia
arrecadar uns prêmios, isso em 1939. Para fazermos isso, criamos a sarandaia,
que é essa que nós estamos procedendo hoje. Foi pedido prêmio na casa
do pessoal amigo, na cidade toda, indo de porta em porta. Então o Sr.
Nelson que era o mais velho e o Sr. Napoleão Melo, arranjaram uma turma,
inclusive eu e meus colegas da banda de música. E aí nós saímos depois
da meia-noite no dia 31 de maio para o dia 1 ° de junho, pedindo os prêmios
para serem colocados no mastro, para ser queimado na antiga rua da Palmeira.
Daí o povo gostou da festa". Outro fato curioso, só encontrado na cidade de Capela é a saída da baiana ou "Nega Baiana", como chama "Seu" Manuca, à procura de presentes para o Mastro. No dia 28 de junho às 15 horas, um homem se veste de mulher: uma saia bem rodada, torço e um cesto imenso na cabeça. Sai da Prefeitura acompanhado do terno de zabumba, pelas casas comerciais pedindo presentes para o Mastro. O cortejo é sempre acompanhado por diversas pessoas e dá-se de maneira rápida. Por volta das 18 horas, encerrase na Prefeitura, onde são guardados os presentes para no dia seguinte serem colocados no Mastro. "Nega baiana, de vestido branco ou mesmo estampado, sapato alto, brincos, etc. Então nós saímos apanhando os prêmios nas casas comerciais. Dia 3i de maio, nas residências, e no dia 28, à tarde nas casas comerciais. Arrecadamos esses prêmios todos e guardamos na prefeitura para no dia 20 de junho colocar no mastro". A festa do Mastro em Capela tem uma característica bem particular: hoje é conhecida como a festa da lama. Depois que a árvore é cortada e retirada da mata, começa o cortejo em direção à cidade. A partir desse momento as pessoas sujam-se umas as outras de lama e vão melando todas as pessoas ao longo do cortejo até chegar na Praça São Pedro. "A turma tem prazer de ir buscar
o mastro e vim melado, bebendo, cantando, tocando zabumba, dançando, aquele
"pau pesado" e tome bebida e quanto mais chove, melhor. A turma
vem molhada. Tudo com respeito. Pega uma camisa velha, coisa e tal, pra
perder ela. Na ida não, na volta, você perde sua camisa, já vem meladinho
de lama. O povo joga lama em você, você joga também em cima deles e aí
até nós chegarmos até a cidade. Nós temos uma "Praça São Pedro",
lá colocamos o Mastro." O nosso trabalho aqui prendeu-se ao fato de registrar a festa que vem acontecendo há mais de 50 anos. Não buscamos analisar aspectos apresentados por ela, porém chamou-nos à atenção a forma como um dos seus organizadores a definiu: uma festa folclórica e não uma simples festa. Essa observação nos remete ao aspecto conceitual e também à dinâmica em que vivem as manifestações populares, bem como as ciênciais sociais. Como nós sabemos da existência de fundadores da festa de Capela, podemos afirmar que a mesma não tem nenhuma relação com o conceito de folclore (anonimato é uma das características do folclore). A festa do mastro não é exclusiva da cidade de Capela, ela ocorre em diversas cidades da região Nordeste, com características distintas e o registro da 1ª á Festa do Mastro não se tem. Ela se mantém em diversos locais, ao longo de décadas e mais décadas, consequentemente tornou-se um fato folclórico, exatamente por esses aspectos expostos acima. |